Em homenagem ao meu amigo e irmão de ideias e de guerrilhas, republico texto de 2009 daqui do Blog.
À ti meu irmão, e a todos os irmãos da turma de 94 lhes ofereço:
Tenho recebido, com humildade, porém cada vez mais convicto de meus princípios, algumas críticas ( queixas??) sobretudo no que se refere à minha incapacidade de ser religioso, ou para ser mais honesto e objetivo, ao meu ateísmo.
À ti meu irmão, e a todos os irmãos da turma de 94 lhes ofereço:
A NOITE BRINCALHONA DA BAHIA
Tenho recebido, com humildade, porém cada vez mais convicto de meus princípios, algumas críticas ( queixas??) sobretudo no que se refere à minha incapacidade de ser religioso, ou para ser mais honesto e objetivo, ao meu ateísmo.
Todos que acompanham o meu trabalho ao longo dos anos, sabem que minha obrigação e minha dedicação, tem a ver exclusivamente com meus pacientes em primeiro lugar, e em segundo lugar com a psicanálise, e que isso impossibilita que meu discurso seja fundamentado em crenças religiosas ou em dogmas de fé, etc.
Aos que não sabem, sou psicanalista Freudiano, e meus princípios analíticos seguem os ensinamentos de Jaques Lacan, e de outras tendências que não se afastem daquilo que Freud preconizou, e que na minha opinião, é a mais eficaz forma de amenizar as dores da alma humana.
Dito isso, quebro o paradigma e hoje, para poder falar da Bahia, vou ter que me aventurar pelo campo religioso...
A noite de Salvador, é como se fosse um campo habitado por rebanhos necessitados de pastoreio como disse Jorge Amado.
Os caminhos tortuosos de Salvador, essa cidade de becos e ladeiras, levam todos à um lugar que se posso chamar de poesia.
Em cada ladeira um ebó , em cada esquina um mistério e em cada coração noturno um grito de súplica, e em cada encruzilhada em Exu solto na perigosa hora do crepúsculo.
Na Bahia, a noite nasce no cais, e dali ela invade a cidade ainda molhada do mar.
E a noite da Bahia, essa mulher vestida de preto, percorre os botequins alegres dançando nas rodas de samba, requebrando sensualmente suas carnes africanas e mexendo seus seios marinhos. E ela brinca não só nos ensaios do Olodum e da timbalada. Ela brinca nas rodas das iawôs ela se faz mais brincalhona ainda.
A noite baiana, desrespeitadora de regras, nessas rodas é o orixá mais aclamado. Cavalo de todos os santos, ela se apresenta em Oxolufã com seus cajados de prata, curvado Oxalá, Yemanjá parindo frutos do mar, Xangô do raio e do trovão, Oxossi das florestas, de Omolu com suas mãos doentes, de Oxumaré das sete cores do arco-íris, o dengue do Oxum e a guerreira Iansã dos rios e fontes de Euá.
Todas as cores e todas as contas, as ervas de Ossani e suas mandingas, seus feitiços, suas bruxarias de sombras e luzes.
Do terreiro, a noite sai para os puteiros mais pobres onde as mulheres idosas vivem seu último tempo de amor e as meninas recém chegadas da área rural aprendem o difícil ofício de meretriz.
Mas ainda assim, é a noite da Bahia. Feita de prata e ouro, brisa e calor. Santa e puta que necessita de presentes para enfeitas ombros e braços, e gargalhadas, e cada ai gemido, cada soluço, cada grito, cada praga e cada suspiro de amor.
O Jorge já citado aqui disse, que pastorear a noite da Bahia, e tratá-la como se ela fosse um rebanho de inquietas virgens em idade de ter homem.
Fraterno Abraço
Muito bem escrito para uma pessoa que se considera ateia!! Parabéns Dr André pelas belas palavras ao rito africano!!
ResponderExcluir