Os atentos conseguem vê-la nas noites furtivas pelos caminhos suburbanos rondando locais as vezes iluminados e outras vezes escuramente sombrios.
Pelo jeito, ela gosta de ser reconhecida somente pela inicial de seu nome que muitas vezes fica tatuada nas camas, poltronas e até das paredes que lhe servem de suporte nas aventuras arrabaleiras... e ao amanhecer, resta um "K" marcado à ferro e fogo pelas suas unhas de fêmea no cio.
E então... um dia... enquanto eu mateava o verde amargo de minhas esperanças, à vi naquilo que imediatamente identifiquei como início de sua busca pelo desejo.
E vi nos olhos de "K", o reflexo de muitos desejos.
E vi naqueles olhos hipnotizantes, desejo de morte, desejo de sangue, desejo pedrador e sobretudo o desejo gelado dos que sabem subjugar tudo aquilo que pode servir ao seu prazer e satisfação.
Logicamente que ela não percebeu minha presença, e por isso não fui privado de presenciar um espetáculo fantástico de suspense e terror, que confesso, ao contar aos amigos, me causa arrepios...
"K" estava silente, camuflada por sob as sombras de um dos tantos obstáculos urbanos naquele ambiente que ela dominava.
E eu a vi ali... linda...selvagem... corpo esguio que emanava volúpia, frieza e paixão pela arte de submeter.
Nascera para isso. Submeter... e para isso usava com louvor e precisão todos os atributos que lhe foram fornecidos pela sua origem e pela natureza de seu desenvolvimento.
É sabido que "K" vinha de uma linhagem de maestrinas da hipnose e da sedução, e sabe-se que até no velho Egito suas antepassadas eram tidas como divindades.
E naquele dia, entre um mate e outro eu vi...
Já tinha ouvido falar que "K" tinha requintes de crueldade na busca do seu prazer, pois depois de subjugar seu objeto de desejo, e depois ainda de horas e horas usando do corpo escolhido, praticava com esplendor a "arte" da degola com a destreza de um guerreiro gaúcho das guerras de antanho.
E ali deixava o corpo morto, sem cabeça, à disposição das formigas e de outros insetos...
Eis que vejo nada menos do que os oito vultos desatentos e desavisados que cantando e divertindo-se uns com os outros, nada sabem do fato de já terem sido escolhidos para divertirem "K" pelas próximas horas.
Vi nos olhos claros a certeza de que ela daria conta dos oito... e mais: Vi que ela estava refletindo sangue naqueles lindos olhos azulados e faiscantes...
Achei na hora, que aquelas vítimas já tinham sido escolhidas e que "K" de há muito havia planejado aquela orgia sanguinária naquele começo de noite, que infelizmente eu seria a testemunha ocular.
Roçando-se lascivamente pelos obstáculos, ela aproximava-se cada vez mais dos ainda quase meninos desavisados que sem saber estavam entre "K" e seu incontrolável desejo.
À poucos metros, eles se dão por conta do risco e vi que o olhar do "K" os petrificou.
Cessaram-se os cantos e a alegria. Iniciou-se o pavor. Eles queria correr, voar pelos telhados se possível fosse... mas era impossível. Estavam sob o jugo gelado e mortífero de "K".
Ela se alonga, e seu corpo mostra toda a beleza de sua natureza esplêndida...
Chegou a hora... vai começar...
Também eu estou hipnotizado e nada consigo fazer, e penso que também a mim ela hipnotizou.
O desejo sádico de "K" precisava de uma testemunha, e na verdade eu era parte de seu plano, pois desde o início ela sabia que eu estava ali, e que veria tudo. Veria tudo calado e inérte.
E pronta... ela prepara seu primeiro salto naquele massacre! Não consigo fechar os olhos... e uma voz interrompe a cena:
"KIKA... deixa os canários do André em Paz!!!!!!! Vai comer tua ração!!!!!!"
Era a voz de minha mãe, chamando atenção de sua siamêsa Kika com relação aos meus canários...
Era a voz da realidade que fez voltarmos todos (eu, "K" (kika), e os oito canários) para nossas rotinas pacíficas e harmônicas...!
Fraterno abraço
André
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