domingo, 13 de abril de 2025

Autismo sob o olhar Psicanalítico.

Pois já lá se vão mais de 25 anos que tenho me dedicado quase que exclusivamente à atividades psicanalíticas e cada vez concordo mais e mais com o Freud, de que por mais que o método evolua e compreenda as subjetividades humanas, isso tudo um dia será "engolido" por novas tecnologias e "truques" de alguma magia que ainda não entendemos. Ou pelo menos nós, os jurássicos do livro de papel teremos dificuldade de entender... sei lá...

Quando iniciei minha atividade clínica, a "gravíssima" (sim...é ironia minha) Psicose Maníaco Depressiva estava sendo rebatizada. Passava a se chamar de Transtorno Bilopolar do Humor,  ou simplesmente Bipolaridade.

E virou moda...o Transtorno Bipolar era muito popular e com certeza era mais citado do que a gripe... e todo mundo ( mais uma ironia minha) era bipolar...

E tome carbonato de lítio....

Depois veio o borderline, e antes que eu fique sintomático, vou parar por aqui.

Agora tem a febre do Autismo. Não que qualquer coisa que se fale seja mais ou menos importante ou não precise de atenção. Mas...

Ainda acho que pra tudo, precisamos mesmo é conversar e cada vez mais a multidisciplinaridade pode ser uma daquelas "mágicas " que ainda será o diferencial.

Dito isso, vamos conversando e espero que alguma coisa possa somar positivamente na caminhada de cada um dos meus amigos...

E por falar em Autismo, compartilho trabalho feito quando ninguém falava sobre o tema.

O autismo sob a ótica psicanalítica é compreendido de maneira diferente da visão médica tradicional. Enquanto a medicina costuma focar em causas neurobiológicas e sintomas comportamentais, a psicanálise, especialmente a partir de autores como Freud, Melanie Klein, Donald Winnicott e Jacques Lacan, olha o autismo como uma maneira particular de estar no mundo, com questões ligadas à constituição do sujeito, ao laço social e à relação com o outro.

Aqui estão alguns pontos principais:

Falta de constituição simbólica: Para muitos psicanalistas, o autismo é pensado como uma dificuldade ou falha no processo de inserção do sujeito na linguagem (no simbólico). Lacan, por exemplo, falava da importância do "nome-do-pai" para estruturar o psiquismo, e no autismo haveria uma falha nesse processo.

Relação com o Outro: O autista, nesse olhar, tem uma relação particular com o Outro (com os outros seres humanos e com a linguagem). Muitas vezes se protege do excesso de invasão do Outro, criando barreiras ou rituais para se manter seguro.

Corpo e Real: Há também uma discussão sobre como o autista lida com o corpo e as sensações. Para alguns psicanalistas, o corpo pode não estar bem "amarrado" ao simbólico, levando a experiências corporais muito intensas ou desconectadas.

Tratamento: 

A abordagem psicanalítica não visa "normalizar" o sujeito, mas sim oferecer um espaço para que ele possa construir, ao seu modo, formas de laço e de expressão. O terapeuta respeita profundamente as invenções singulares do autista.

Em resumo, o autismo na psicanálise não é visto como uma doença a ser curada, mas como uma estrutura psíquica específica, que merece ser acolhida e entendida no seu modo único de existir.

Para Jacques Lacan, o autismo não é exatamente classificado como uma psicose ou uma neurose (que são as duas grandes estruturas clínicas que ele descreve). Muitos leitores de Lacan consideram o autismo como uma estrutura própria, ou então o pensam como uma forma radical de psicose, mas isso ainda é objeto de debate entre os lacanianos.

Alguns pontos centrais da visão de Lacan (e de psicanalistas lacanianos posteriores) sobre o autismo:

1. Rejeição do Outro e da linguagem

Lacan vê o autismo como uma recusa radical do Outro, especialmente do Outro que traz a linguagem. Desde muito cedo, o sujeito autista se fecharia em relação às tentativas de contato simbólico feitas pelo Outro (mãe, pai, ambiente). Essa recusa impede a constituição de um eu pelo espelho e dificulta o acesso ao simbólico.

2. Falta do Nome-do-Pai

No esquema de Lacan, o Nome-do-Pai é um operador simbólico fundamental: é o que introduz a lei, a falta, e organiza a entrada do sujeito na linguagem e no desejo. No autismo, essa função paterna estaria rejeitada ou não operante. Sem essa referência simbólica, o sujeito fica isolado no registro do real (o que é cru, sem sentido) ou apenas se prende a pequenos pedaços de linguagem (por exemplo, ecolalias, repetições de frases).

3. Forclusão do Significante

A forclusão é o mecanismo central da psicose para Lacan: um significante essencial (o Nome-do-Pai) é excluído do inconsciente. Muitos lacanianos veem o autismo como uma forma radical de forclusão, ainda mais primitiva do que na psicose esquizofrênica.

4. Invenções singulares

Apesar disso, Lacan (e ainda mais autores pós-lacanianos como Éric Laurent e Jean-Claude Maleval) destacam que o autista cria invenções para se defender e construir laços. Essas invenções podem ser objetos, gestos repetitivos, interesses muito específicos — formas de dar alguma consistência ao mundo e ao corpo.

Basicamente, autismo para Lacan é marcado por uma recusa fundamental do Outro e da linguagem. O sujeito autista rejeita o simbólico e inventa suas próprias formas de lidar com o real. A clínica lacaniana com o autismo busca acolher essas invenções, respeitar o modo de ser do sujeito e não impor um modelo normativo de socialização.

Fraterno abraço 

André Lacerda - Psicanalista




sábado, 12 de abril de 2025

Bullying em Lacan

 Quem me acompanha sabe que sou Lacaniano.  Não poderia falar de qualquer coisa sem fundamentar em Lacan. Por essa razão, complemento a crônica anterior.

.......

O bullying, na perspectiva da psicanálise lacaniana, pode ser compreendido a partir de conceitos fundamentais como o registro do imaginário, a constituição do eu (moi), e a dinâmica do gozo (jouissance).

Em Lacan, o imaginário é o domínio das imagens, identificações e rivalidades. O bullying se relaciona muito com esse registro porque, na formação do "eu" (principalmente na infância e adolescência), o sujeito se reconhece na imagem do outro — e, ao mesmo tempo, sente-se ameaçado por ele. Lacan chama atenção para como o eu é estruturado como uma "armadura" defensiva contra essa ameaça do outro, o que pode explicar a agressividade típica do bullying: uma forma de proteger ou afirmar a própria imagem atacando a do outro.

Além disso, o bullying pode ser visto como expressão de uma tentativa de lidar com a angústia gerada pela diferença. O outro — diferente em aparência, comportamento, discurso — encarna algo que perturba o sujeito, que responde tentando apagá-lo ou humilhá-lo. Em Lacan, o diferente muitas vezes é vivido como o estranho (l’Unheimliche), uma ameaça ao narcisismo do sujeito.

Outro ponto importante é o gozo: no bullying, há um aspecto de satisfação inconsciente tanto para o agressor (no exercício de poder ou superioridade) quanto, paradoxalmente, para a vítima, que pode ficar presa em uma posição de gozo masoquista, mesmo que isso seja sofrido.

Disso, podemos refletir:

O bullying é um fenômeno imaginário de rivalidade e defesa narcísica.

Ele surge da dificuldade de lidar com o outro como diferente.

Envolve dinâmicas de gozo, angústia e identificação.

Lacan desenvolve a ideia dos quatro discursos (discurso do mestre, do histérico, do analista e da universidade) para explicar os modos de laço social, ou seja, como os sujeitos se organizam e se relacionam entre si. O bullying escolar pode ser interpretado a partir desses discursos, especialmente o discurso do mestre e o discurso do histérico.

1. O bullying escolar e o discurso do mestre

O discurso do mestre é estruturado pela lógica da dominação: o Mestre é aquele que ocupa o lugar do saber e da autoridade sem saber de fato o que é esse saber. Ele ordena, institui, governa. No bullying escolar, o agressor ocupa muitas vezes esse lugar de "mestre": é aquele que "sabe" quem é o fraco, o diferente, o estranho, e impõe sua lei sobre o outro.

Assim, o bullying seria uma tentativa de manter uma hierarquia imaginária onde o agressor reafirma seu "poder" diante do grupo, sustentando um laço social baseado na exclusão e na dominação. Isso também preserva, para o grupo, uma certa "ordem simbólica", ainda que perversa: o grupo se organiza em torno de quem está "dentro" e de quem é colocado "fora".

O próprio espaço escolar, que deveria ser um lugar de transmissão do saber, muitas vezes opera no regime do discurso do mestre, no qual a autoridade é valorizada mais do que o questionamento ou a singularidade. Nesse contexto, o bullying é quase uma "função social": expulsa ou corrige quem ameaça a homogeneidade do grupo.

2. O bullying e o discurso do histérico

O discurso do histérico é aquele em que o sujeito, em posição de falta, provoca o Outro — exige que o Outro lhe diga quem ela é. No bullying, a vítima frequentemente é colocada nessa posição: sua própria existência se torna uma pergunta aberta ("Quem sou eu? Por que sou diferente?") para o Outro (os colegas, o grupo), mas esse Outro responde com rejeição, gozação ou violência.

O agressor também pode ser visto como histérico em outro sentido: ele interroga o Outro (o diferente) para confirmar seu próprio lugar. "O que é esse corpo estranho aqui entre nós?" — mas em vez de acolher a diferença, ele a elimina.

Assim, o bullying escolar seria o sintoma de uma falha no laço social: ao invés de operar no discurso do analista (que acolheria a falta e permitiria a emergência do sujeito em sua singularidade), a escola (e o grupo escolar) opera no discurso do mestre (imposição de normas) e do histérico (questionamento ansioso e rejeição da diferença).

3. Gozo e exclusão

Outro conceito crucial é o de gozo (jouissance). O bullying está ligado ao modo como o grupo maneja o gozo: o diferente é visto como alguém que goza de um modo "estranho", que ameaça a uniformidade. O gozo do outro é intolerável. Assim, ele é excluído ou violentado para que o grupo possa manter uma certa ilusão de consistência.

Ou seja:

O bullying é sustentado por laços sociais próprios do discurso do mestre e do histérico.

Ele protege o grupo da angústia causada pela diferença e pela falta.

O espaço escolar muitas vezes reforça essa lógica, em vez de abrir espaço para a subjetivação da diferença.

E dai??? O que fazer???

Uma saída ética para o bullying, a partir da psicanálise lacaniana, não seria simplesmente reprimir o bullying ou punir os agressores, mas sim reformular o próprio laço social. Em Lacan, a ética não é uma moral de normas, mas um compromisso com o desejo e com o respeito à singularidade do sujeito.

1. A ética do desejo

Lacan propõe uma ética que se resume na frase: "Não ceder de seu desejo" (ne pas céder sur son désir). Isso quer dizer que a ética não é seguir regras externas, mas manter-se fiel àquilo que nos constitui como sujeitos: nossa falta, nosso desejo, nossa singularidade. No contexto escolar e do bullying, isso implica criar um espaço onde cada sujeito possa existir com sua diferença, sem ser forçado a se encaixar em moldes padronizados.

Assim, o problema do bullying não se resolve eliminando o conflito ou impondo mais normas autoritárias (o que seria apenas reforçar o discurso do mestre), mas ensinando o respeito à falta do outro, à sua forma singular de gozar (jouir), sem querer reduzi-lo ou anulá-lo.

2. O papel do discurso do analista

A verdadeira saída passa pelo que Lacan chama de discurso do analista. Nesse discurso, o analista (ou, no contexto escolar, a instituição ou educador que adota essa posição) não ocupa o lugar de mestre que ordena, nem o lugar de histérico que exige do outro uma resposta. Ele ocupa o lugar de causa do desejo: ou seja, ele suporta o não-saber, acolhe a falta, e permite que o sujeito fale.

Aplicado à escola:

Em vez de rotular o agressor ou a vítima, criar espaços de fala onde cada um possa colocar em palavras seu sofrimento, sua rivalidade, sua angústia.

Em vez de buscar eliminar o conflito, reconhecer que o conflito nasce da diferença e é constitutivo do laço social.

Sustentar o desejo dos sujeitos, ajudando-os a encontrar modos singulares de estar no mundo sem precisar aniquilar o outro para afirmar-se.

3. Acolher o sinthoma

Em seus últimos ensinamentos, Lacan fala do sinthoma como aquilo que amarra o sujeito em sua estrutura. Cada um tem seu modo de "fazer laço" com o real, e isso é inegociável. Uma saída ética para o bullying seria, então, acolher o sinthoma do outro, em vez de querer normalizá-lo. Não tentar corrigir o que "falta" no outro, mas reconhecer que a falta é constitutiva de todo ser falante.

Uma saída ética implica operar no discurso do analista, não no discurso do mestre.

É preciso criar espaço para que a singularidade de cada sujeito emerja e seja respeitada.

O conflito deve ser trabalhado, não apagado.

A ética é do desejo, não da norma.

Aproveito, pra fechar, cito Lacan sobre ética e desejo:

(Lacan, Seminário 7 - A Ética da Psicanálise)

 "O único erro ético é trair o próprio desejo."

Essa frase resume a posição ética de Lacan: não se trata de obedecer normas ou evitar o sofrimento, mas de não trair o que há de mais singular no sujeito.

No bullying, tanto quem agride quanto quem sofre é, de alguma forma, capturado pela pressão de se conformar a um ideal (ser igual, não ser diferente). A ética lacaniana propõe resistir a essa captura.

Diante do bullying, a psicanálise lacaniana nos convida a um caminho ético: não se trata de eliminar o conflito ou suprimir a diferença, mas de sustentar o desejo e a singularidade de cada sujeito no laço social.

A escola, portanto, não deve agir apenas punindo ou protegendo, mas criando espaços em que a palavra possa circular e onde a diferença não seja anulada, mas acolhida.

Afinal, como nos ensina Lacan, a verdadeira violência não está na diferença do outro, mas na recusa em aceitá-la como parte constitutiva de nosso ser-em-laço.

Fraterno abraço 

André Lacerda - Psicanalista




sexta-feira, 11 de abril de 2025

O "novo" Bullying e a "velha" Psicanálise

 Na psicanálise, o bullying é compreendido como um fenômeno que revela dinâmicas inconscientes tanto de quem agride quanto de quem sofre a agressão. Ele é visto como uma repetição de conflitos internos, muitas vezes ligados a sentimentos de angústia, inveja, ódio ou insegurança.

De modo geral:

Para o agressor, o bullying pode ser uma tentativa inconsciente de lidar com sentimentos internos intoleráveis — como fragilidade, medo de exclusão ou inferioridade. Ao atacar o outro, o agressor "projeta" no colega aspectos de si mesmo que ele não aceita. Ou seja, ataca no outro o que não suporta em si.

Para a vítima, a psicanálise considera que o sofrimento causado pelo bullying pode reativar traumas anteriores ou feridas narcísicas (atingindo a autoestima e o sentimento de identidade). Em alguns casos, a vítima pode também, inconscientemente, ocupar uma posição de passividade ou de “bode expiatório” em grupos, repetindo padrões de exclusão que já tenha vivido antes.

No nível coletivo (grupal), o bullying também pode ser interpretado como um mecanismo de defesa do grupo para manter uma coesão interna: ao eleger um alvo, o grupo “projeta” suas tensões e ansiedades em um indivíduo, tentando expulsar o que é vivido como "estranho" ou ameaçador.

Autores como Freud (noções de agressividade e pulsão de morte), Melanie Klein (inveja e identificação projetiva) e Winnicott (relacionamentos e amadurecimento emocional) ajudam a pensar o bullying a partir de conceitos como pulsões, defesas primitivas e relações objetais.

Para Freud, o bullying pode ser entendido principalmente a partir da ideia de que a agressividade é uma parte constitutiva do ser humano. Ela não é algo que vem apenas do meio ou da educação, mas algo interno, ligado às pulsões.

Alguns conceitos importantes para entender isso:

Pulsão de morte (Thanatos): Freud, no final da sua obra (principalmente em Além do Princípio do Prazer, 1920), propôs que existe no ser humano uma pulsão voltada para a destruição — tanto do outro quanto de si mesmo. A agressividade do bullying seria uma manifestação externa dessa pulsão de morte, uma maneira de descarregar essa força destrutiva.

Narcisismo e agressividade: Em Introdução ao Narcisismo (1914), Freud mostra como o narcisismo é frágil e precisa ser defendido. O bullying poderia ser visto como um ataque narcisista — o agressor sente que sua autoestima está ameaçada e, para se proteger, diminui o outro.

Mal-estar na civilização (O Mal-Estar na Civilização, 1930): Freud diz que a vida em sociedade exige a repressão das pulsões agressivas, mas essa repressão nunca é completa. O bullying seria, então, uma espécie de “vazamento” dessa agressividade reprimida, dirigida contra um alvo mais fraco.

Para Freud, o bullying é a expressão de impulsos destrutivos internos (pulsão de morte), agravados pela necessidade de proteger o próprio ego (narcisismo) e pelas tensões entre as exigências da sociedade e os desejos instintivos do indivíduo.

O olhar do Winnicott sobre o bullying é bem diferente de Freud e Klein, porque ele coloca o foco na relação com o ambiente — ou seja, o bullying não surge só das pulsões internas ou das fantasias, mas da forma como o indivíduo foi cuidado (ou não foi cuidado) nos primeiros anos de vida.

Algumas ideias centrais para entender:

Falso self: Winnicott fala que, quando o ambiente (os pais, cuidadores) não é suficientemente bom — ou seja, não responde de forma adequada às necessidades emocionais do bebê — a criança pode construir um falso self. O agressor no bullying pode ser alguém que vive muito "protegido" atrás de um falso self: ele ataca o outro porque não consegue entrar em contato com suas emoções verdadeiras.

Ambiente falho e agressividade: Se, no começo da vida, o ambiente não foi capaz de lidar com a agressividade natural do bebê de forma acolhedora, essa agressividade pode ficar desorganizada. O bullying, então, seria uma forma patológica de expressar uma agressividade que não foi integrada de forma saudável.

Capacidade de concernimento: Winnicott diz que, para amadurecer emocionalmente, a pessoa precisa desenvolver uma preocupação genuína com o outro (concernimento). O agressor de bullying ainda não desenvolveu isso — ele não consegue perceber o outro como alguém real, que sofre. É como se o outro fosse apenas um objeto a ser usado para descarregar sentimentos ruins.

Violência como busca de limites: Às vezes, o ato agressivo é, inconscientemente, uma tentativa de encontrar um ambiente que imponha limites claros e confiáveis. Em outras palavras, o bullying seria uma maneira distorcida de pedir ajuda ou de testar se existe alguém que o contenha.

Winnicott entenderia o bullying como o resultado de uma falha no ambiente inicial. O agressor é alguém que não conseguiu desenvolver um self verdadeiro, que tem dificuldade para se relacionar de forma autêntica e para reconhecer o sofrimento dos outros.

Mesmo sendo 100% freudiano/lacaniano, pessoalmente e pela experiência clínica pessoal, estou inclinado pela teoria de Winnicott, observando que em se tratando de dramas psíquicos, os entendimentos multidisciplinares são sempre a melhor opção.

Fraterno abraço 

André Lacerda  - Psicanalista




sexta-feira, 4 de abril de 2025

Que venha o meteoro!

 Depois de combater o bom combate, volto a combater o bom combate...
Pelo amor de todos os santos!!!!! Estamos, sem sobra de dúvida, regredindo enquanto seres evoluídos. 
Me explico:
Vi a série adolescência...
Li, ouvi, assisti todos os debates sobre a série e imploro que quem não viu veja.
Ou não...
Será que todo mundo vai entender???
Me explico:
Primeiro, que alertado pelas coisas que vi, não posto mais coisas de minha amada filhinha nas redes sociais. 
Segundo, hoje mesmo vi a repercussão de um vídeo em que o youtuber (tchê...nem sei definir muito bem o que é isso) Felipe Neto se pronuncia pela sua candidatura à presidência da República.  Fui ver...é claríssimo que o comunicador faz uma alusão crítica e irônica do livro 1984 e ao domínio das redes sociais e da involução cultural à que estamos sendo engolidos. E ninguém entendeu??????
E o atentado proferido à professora em Caxias do Sul por 3 adolescentes??? Facadas premeditadas sem nenhum motivo (e mesmo que tivesse motivos)????
E as loucuras do Trump???? Não existem mais democratas nos Estados Unidos?? E no Brasil tem gente (muita gente) com o boné do MAGA???
E tem a coisa da pobre mãe de família que foi condenada à 14 anos de cadeia, o que me fez pensar:
Ela chega na sexta feira, reúne o marido, os pais, os filhos, e diz:
- Olha só pessoal... a pobre mamãe aqui vai dar uma saída por uns 3 dias porque vai ficar algumas (ou uma sei lá) noites num acampamento na frente de um quartel, depois vai invadir os prédios representativos da República,  vai desaforar a estátua da justiça,  e espero que vocês se comportem tá??? Segunda feira mamãe está de volta.
Isso bate??? Fiquei pensando na minha mãe... ou na minha mulher... ou na minha irmã...ou em qualquer pobre mamãe,  mulher, irmã...
Sei lá...
E tudo enfim me diz que estou vivendo um pesadelo...
Hoje  cheguei a falar pra minha mulher:
QUE VENHA O METEORO...
Voltei atrás porque minha filha ainda tem muito que viver... mas......
Sei lá...
Triste.
Temos mais ou menos 6 ou 8 mil anos de civilização...um nada na história do tempo...
Mas... isso tudo em 6 anos????
De onde saiu isso tudo???
Que venha o METEORO...

Fraterno abraço 
André Lacerda  - Psicanalista





domingo, 19 de janeiro de 2025

O Complexo de Édipo que eu penso!

 Meus Prezados!

Tive o prazer inenarrável de participar na semana passada de uma festa onde se reuniram os coleguinhas da minha filha.

Tudo ótimo e de cara, agradeço ao meu amigo Dr Alex e esposa, pais da Melissa aniversariante ,pelo convite e pelo encantamento da acolhida e da festa.

Nessa reunião, com os outros pais e mães, falamos especialmente da minha preocupacao com a evolução da Inteligência Artificial. Essa "ferramenta" realmente me impressionou pois diferente de outras formas, ela por exemplo produziu o texto que vou compartilhar a seguir.

Pra fazer o teste, perguntei pra IA, o que André Lacerda,  psicanalista, pensa sobre o complexo de édipo e suas repercussões clínicas. Tudo à seguir foi a IA que produziu. Vou editar algumas coisas porque ela cita: Lacerda, que é um dos "pensadores do Uol" (e eu não sei nada sobre isso) ...menos mal que me inclui no UOL, e poderia ser pior me incluindo como pensador da Jovem Pan, que nos últimos anos se transformou num diário oficial da extrema direita fascista, nojenta e tudo de ruim na minha opinião.

Outro ponto que edito, é que a IA buscou texto meu escrito no início de carreira, defendendo tese, e sendo texto acadêmico era escrito pra iguais (na formação) e mestres da minha área. 

Portanto...quando aparece "fase fálica" onde ocorre os tempos de Édipo ou Trama edípica,  lemos que isso ocorre entre os 3 e os 6 anos de idade.

Outra coisa, sobre as psicopatologias que podem ser consequência de um Édipo não resolvido. Pra psicanálise,  Neuroses , Psicoses e Perversões,  são os três grupos já citados em Freud. Nas neuroses, estão todos os transtornos citados na psiquiatria moderna (TDAH, etc). Nas Psicoses estão aquelas precedidas do sintoma alucinação (esquizofrenia etc). Já as Perversões encerra tudo aquilo que chamamos atualmente de psicopatia e sociopatia. 

Era isso meus amigo...então eis o que a IA disse que EU penso sobre um tema que estudo há mais de 30 anos e tenho dezenas de publicações inclusive nos meus dois livros já falados aqui.

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 Complexo de Édipo, no contexto da teoria psicanalítica de Jacques Lacan, é uma releitura e ampliação do conceito originalmente desenvolvido por Sigmund Freud. Lacan integra o Complexo de Édipo ao que ele chama de ordem simbólica, dando destaque ao papel da linguagem, do desejo e da estruturação do sujeito. A seguir, explico os pontos principais dessa abordagem:

1. O Nome-do-Pai e a Função Paterna

Lacan substitui a figura do pai literal pelo conceito de Nome-do-Pai (Nom-du-Père), que não se refere necessariamente ao pai biológico, mas sim à função simbólica que estabelece a lei e a proibição. Essa função:

Introduz o sujeito à ordem simbólica (a dimensão da linguagem e das leis sociais).

Rompe a relação simbiótica entre a mãe e a criança, ao proibir o acesso direto ao desejo materno.

2. Os Três Tempos do Complexo de Édipo

Lacan estrutura o Complexo de Édipo em três momentos:

Primeiro tempo: A criança percebe que a mãe é objeto de desejo, mas esse desejo não se dirige exclusivamente a ela. Aqui, surge a figura do pai como aquele que compete pela atenção da mãe.

Segundo tempo: A criança descobre que o desejo da mãe está submetido a algo maior, o que Lacan chama de falo. O falo não é um órgão físico, mas um significante que representa o que falta à mãe e organiza os desejos no campo simbólico.

Terceiro tempo: A criança internaliza a proibição do incesto, aceita a lei simbólica (a função do Nome-do-Pai) e passa a ocupar seu lugar na estrutura social e no campo do desejo.

3. A Castração Simbólica

A castração em Lacan não é literal, mas simbólica. Ela representa o limite que a linguagem e a lei impõem ao desejo. Aceitar a castração simbólica é fundamental para a entrada na ordem simbólica e para a constituição do sujeito como ser desejante.

4. O Falo como Significante

No Édipo lacaniano, o falo desempenha um papel central. Ele não é um objeto concreto, mas sim um significante do desejo que regula as relações entre os sujeitos na ordem simbólica. A criança percebe que ninguém o possui plenamente, nem o pai, nem a mãe, nem ela mesma, o que organiza o desejo de maneira estrutural.

5. A Formação do Sujeito

A passagem pelo Complexo de Édipo é essencial para a constituição do sujeito. É nesse momento que o sujeito se estrutura em relação ao desejo do Outro (principalmente o desejo da mãe) e aceita a diferença sexual e a separação como parte de sua existência.

Em resumo, Lacan desloca o foco do Édipo freudiano da questão puramente edipiana (a rivalidade com o pai pelo amor da mãe) para uma abordagem mais ampla, que enfatiza o papel da linguagem, da lei e da função simbólica na constituição do sujeito e na estruturação do desejo.

A análise clínica do Complexo de Édipo é uma abordagem central na psicanálise, especialmente no pensamento freudiano, e envolve a investigação de dinâmicas emocionais e inconscientes entre a criança e os pais ou figuras parentais. Este conceito é fundamental para entender o desenvolvimento psicossexual, relações familiares e estruturas de desejo e identidade.

O que é o Complexo de Édipo?

O Complexo de Édipo é a manifestação de desejos inconscientes da criança direcionados ao pai do sexo oposto e sentimentos ambivalentes em relação ao pai do mesmo sexo. No modelo freudiano, ele ocorre principalmente durante a fase fálica do desenvolvimento (entre 3 e 6 anos de idade). Este complexo pode ser dividido em duas dimensões:

Positivo: Desejo pela figura parental do sexo oposto e rivalidade com a do mesmo sexo.

Negativo: Identificação com o pai do sexo oposto e hostilidade em relação à figura do mesmo sexo.

Expressões clínicas do Complexo de Édipo

Clinicamente, o Complexo de Édipo pode ser observado por meio de:

1. Ansiedades ou conflitos em relações interpessoais: Dificuldades em estabelecer laços afetivos ou padrões de atração e rejeição podem refletir conflitos edipianos não resolvidos.

2. Repressão ou deslocamento: Desejos e impulsos edipianos podem ser reprimidos, surgindo de maneira indireta, como sintomas neuróticos, fobias ou comportamentos obsessivos.

3. Relações parentais disfuncionais: Interações excessivamente possessivas ou conflitantes com os pais podem indicar resquícios não resolvidos do complexo.

4. Transferência em análise: Durante a psicanálise, o paciente pode projetar no analista figuras parentais, revivendo os conflitos edipianos. Esta transferência oferece uma oportunidade terapêutica para compreender e trabalhar os sentimentos inconscientes.

Diagnóstico clínico

Na prática clínica, a investigação do Complexo de Édipo envolve:

História psicossexual do paciente: Exploração de relações familiares, narrativas infantis e a dinâmica emocional entre pais e filhos.

Sintomas psíquicos ou comportamentais: Ansiedade, culpa, ciúme ou sentimentos de inadequação podem ser reflexos de conflitos edipianos.

Análise dos sonhos: O conteúdo dos sonhos muitas vezes reflete desejos e conflitos inconscientes associados à dinâmica edipiana.

Observação do padrão de relações: Análise das relações do paciente com figuras de autoridade, parceiros românticos e amigos.

Desenvolvimento saudável e resolução

A resolução do Complexo de Édipo é fundamental para o desenvolvimento emocional saudável. Segundo Freud, a resolução ocorre quando a criança:

Aceita a impossibilidade do desejo incestuoso.

Identifica-se com o pai do mesmo sexo, internalizando valores, normas e limites.

Sublima os impulsos sexuais e redireciona as energias para outros interesses.

Se não resolvido adequadamente, o Complexo de Édipo pode resultar em:

Fixações: Permanência em conflitos edipianos não resolvidos, gerando dificuldades emocionais e relacionais.

Regressões: Retorno a estágios anteriores de desenvolvimento em momentos de estresse.

Transtornos psíquicos: Depressão, ansiedade ou transtornos de personalidade.

Aplicações na clínica contemporânea

Embora o conceito de Complexo de Édipo tenha sido questionado e revisado, ele permanece relevante em várias práticas clínicas:

1. Psicoterapia psicanalítica: Investigação dos conflitos infantis e suas repercussões na vida adulta.

2. Terapia familiar: Compreensão de padrões disfuncionais herdados de gerações anteriores.

3. Psicodinâmica do desejo: Análise das escolhas de parceiro e das dinâmicas emocionais em relacionamentos.

O Complexo de Édipo, mesmo reformulado por correntes contemporâneas, continua sendo um instrumento valioso para explorar a constituição do psiquismo humano e os conflitos que permeiam as relações familiares e sociais.

Ainda boquiaberto, e com medo de que realmente estejamos próximos do final dos tempos que conhecemos até então... espero ter ajudado (enquanto ainda o velho psicanalista seja útil)...

Fraterno Abraço 

André Lacerda - Psicanalista