Naquela manhã de sol releu fragmentos do poema de Pessoa:
".... E eu que tanto amo a morte e a vida, se tivesse coragem também me mataria!"
Não via outro caminho que não fosse o suicídio. Estava decidindo por duas hipóteses apenas: Ou o suicídio indigno da desistência onde sua persona não mais tivesse face, ou o suicídio do corpo e da alma, mas achava que esse não teria coragem.
Fugir não.... Fugir seria pior que o suicídio.
Era o capitão de seu barco e afundaria entre as velas rolando por sobre o tombadilho, a popa e a proa. Com sorte a quilha arrancaria sua cabeça antes do afogamento que é morte cruel. Ou quem sabe com sorte, os cordames do velame se enroscassem no seu pescoço e ele morreria enforcado antes do afogamento. Que a morte do afogado é cruel. Com sorte o enforcamento.
Lembrou-se dos enforcados da história, e Judas morreu enforcado tendo no bolsos os trinta dinheiros da sua traição ou da sua crença. Há controvérsias. Certa vez quando leu a obra do historiador Flávio Josefo (A Guerra dos Judeus), pensou que Judas e Jesus de Nazaré na verdade tinham os mesmos propósitos.
Ambos queriam a libertação do povo de Israel que vivia sob a dominação de Roma. Jesus prometeu a libertação. Judas acreditou. Quando Jesus falou que seu reino não era aquele, e que dessem a César o que era de César, Judas ficou puto da cara e entregou seu mestre aos fariseus. Porque naquela época já tinha a corrupção.
Depois se arrependeu.
Escolheu uma árvore morta. Laçou o galho mais forte. Em lágrimas de sal envolveu o pescoço com o nó da forca. Pulou. Em um segundo pescoço quebrado. Morto. Balançando pendurado numa árvore no alto de um penhasco dantesco. No bolso da túnica... os trinta dinheiros.
Pensou que a forca seria um ato digno mesmo que infernalmente dramático. E não teria os trinta dinheiros no bolso da túnica. Não traiu e não se corrompeu. Buscou apenas a libertação. Perdeu pro sistema. Foi engolido.
Mas forca não....
Agora era esperar a fúria das águas e afundar com o barco...
Seria achado por algum resgate entre o passadiço. Entre a proa e a popa.
Fraterno Abraço
André Lacerda - Psicanalista
ANDRÉ LACERDA - PSICANALISE
ResponderExcluirEXCELENTE CRÔNICA!!!
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