segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Eu Não vou Calar!

O meu primeiro projeto literário, lá no ano de 2008,  tinha como título uma expressão traumática: Eu Não Posso Calar! A Triste História dos Escravos da Pedra!
Cheguei a escrever alguns capítulos mas abortei o projeto por razões absolutamente pessoais e em nenhum momento deixar de tratar clinicamente todos os casos estudados. 
Estou abortando neste momento um outro assunto recorrente. E não por razões pessoais. E isso também não significa que eu abandonarei casos clínicos que estejam ou estarão sob minha responsabilidade terapêutica.
Me explico, já pedindo licença à Dra. Laura Nunes da Cunha minha editora, e aos meus colegas criadores de conteúdo da página Reflexões da Psicanálise da rede social Facebook, onde são publicados minhas crônicas originalmente publicadas no Blog e em outas mídias. 
Insisto; retomo o assunto por considerar que o problema é recorrente e as notícias estão ai todos os dias pra qualquer pessoa que saiba ler saiba que se trata de algo grave. 
E como é reverberado pelo sindicato médico do RS " A informação é o melhor remédio!"
Publiquei algumas crônicas alertando e expondo minhas razões à cerca da "glamourização" da prostituição principalmente nas redes sociais e na verdade em todas as mídias.
Então, recebi muitas mensagens de apoio e agradecimento pelo texto e pelo serviço que se prestava.
Recebi também muitas mensagens me chamando de recalcado, sectário, preconceituoso, veado, idiota, filho-irmão-marido-namorado-primo-sobrinho e tudo o mais de prostitutas, corno, e outas coisas que os queridos leitores podem imaginar.
Não me ofendi por me chamarem de veado. Nem de idiota. Nem de ser qualquer coisa de prostitutas. E na verdade nem qualquer coisa que possam ter dito para me atingir o meu emocional que aliás, é bem analisado.
Mas não sou recalcado. Nem sou sectário. Nem sou preconceituoso. 
Reitero que pessoalmente acho que uma das mais terríveis humilhações humanas é o exercício do poder de um ser humano sobre outro ser humano. E se esse exercício é na relação sexual é tão cruel quanto as torturas e os pelourinhos da escravidão, 
A ONU alerta. A imprensa brasileira alerta e recentemente a polícia federal do Brasil e da Espanha resgatou mulheres que estavam sendo submetidas à todas as agruras imagináveis. 
A Espanha , diga-se de passagem, é o país europeu com maior incidência dessa prática criminosa que é o tráfico de pessoas. E no Brasil existem aliciadores em todas as capitais especializados em levar mulheres pra "trabalharem" principalmente nas regiões de Barcelona e Madri. 
Prometem ganhos de milhares de euros. Raras mulheres voltam com algumas centenas de euros. A maioria sobrevive em prostíbulos infectados dos subúrbios de Madri ou Barcelona e quando não morrem, sofrem com a tuberculose, a anemia, e todas as DSTs.
Insisto.
Podem chamar do que quiserem: Acompanhantes VIP, Modelos de Book Rosa, Garota de Programa, e até como já ouvi alguém falar, Menina de catálogo em sites destinado para adultos.
Na verdade, em qualquer lugar, Porto Alegre, Rio, Brasília, Paris, Madri ou Barcelona, serão sempre tratadas de forma humilhante. E sempre serão chamadas e classificadas como mulher-dama, meretriz, alcouceira, quenga, marafona, rameira, mariposa, ou simplesmente prostituta.
E toda vez que eu achar necessário não vou calar. Porque mães, filhos, pais, irmãos, amigos e todos que amam essas mulheres expoliadas e humilhadas, só terão voz quando a voz não terá mais sentido de ser ouvida. 
Esperando todas as censuras, 
Fraterno Abraço
André Lacerda - Psicanalista
           

Uma História do Mundo!

Estou lendo pela terceira vez o indicadíssimo livro do David Coimbra - Uma História do Mundo - que recomendo mesmo pra todo mundo.
Pois nesse livro, o autor de uma maneira prazerosa de ler e entender, retrata o surgimento da civilização assim como todas as fases importantes da história do mundo.
Gosto particularmente do capítulo 9 (O que Freud dizia de Moisés), onde o David explica a teses freudiana  contida no livro Moisés e o Monoteísmo.
Mas gosto particularmente  quando o autor aborda que na verdade a civilização foi uma invenção da mulher.
Entenda por civilização, a vida como a conhecemos com todas as suas regras e conceitos.  Nada a ver com o bom e velho período paleolítico onde não existiam cobranças conjugais, nem casamento, nem família. Os homens viviam caçando e pescando, as mulheres cuidando dos filhos, tudo muito tranquilo segundo o David.
E segue o autor na tese:

" De que mais precisava o homem?
De nada.
Tendo alcance de um braço tudo o que desejava, o homem não pensava no futuro, vivia do presente e para o presente. Não pensando no futuro, o homem não se angustiava. Não se angustiando, o homem não tinha problemas existências, depressão, aflições em geral, banzo.
Os psicanalistas teriam dificuldade de encontrar freguesia naquele tempo."

Outra parte interessante da obra do David, é uma abordagem que é feita à cerca da atividade sexual das mulheres.
"Sexo é coisa de homem... e algumas mulheres praticam a atividade por puro diletantismo."
E o meu amigo cita algumas famosas como Catarina, a Grande, Cleópatra, Messalina e a Teodora - imperatriz de Bizâncio. Messalina era imperatriz que virou prostituta. Teodora, prostituta que virou imperatriz.
Dia desses vi um comentário de uma mulher no facebook que teve milhares de curtidas e comentários. A moça mandava um recado:
" Parem de mandar fotos de seus pintos no meu in box! Quem gosta de pinto é gay! Mulher gosta é de dinheiro!"
Juro que depois de rir muito, comecei a pensar psicanaliticamente...
Então valei-me meu amigo David Coimbra que não canso de citar:
"O Sexo comanda as ações do macho. Da mulher não.
A mulher, o que a comanda é a reprodução da espécie. Não duvido que neste momento você se lembre da sua colega que vem trabalhar com aquelas roupinhas e que olha para os homens de um jeito blasé que parece urrar: "eu quero sexo, garoto!". Sim, eu sei que você sai se lembrar dela e vai argumentar: " Luaninha gosta de sexo como se fosse um homem."
Mas você está enganado.
É tudo um truque de Luaninha. Em sua maioria, as mulheres  usam a premência masculina pelo sexo para alcançar seus objetivos. Nem que os objetivos sejam, apenas, de medir a extensão de seu poder. É o caso da mulher que acena com promessas e depois recua. Ela queira, mas desistiu? Não. Ela nunca quis. Ela só pretendia constatar até onde poderia leva-lo a você e a essa sua infantil agonia sexual."

Então... recomendo de verdade a obra do David, que depois de eu ler 3 vezes posso garantir que na verdade é uma homenagem à todas as mulheres de todas as idades, de todos os tempos e de todas as culturas.
Fraterno Abraço
André Lacerda - Psicanalista

    

  

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Minhas Dependências!

Descobri que sou dependente. Dependente de um monte de coisas. E dependente de muitas coisas que na verdade não são dependentes na sua essência.
Sou dependente do meu carro.
Vejam bem... sou dependente do meu carro. Não estou falando que por ser um homem do século XXI necessito de um veículo para os diversos deslocamentos que se faz hoje em dia numa metrópole atual.
Sou dependente do meu carro. Do cheiro do meu carro. Do sistema automático de marchas e dos dois faróis extras que o meu carro tem. Mas sou dependente fundamentalmente do MEU carro. Deprimo quando ele está na revisão ou parado para reparos.
Sou dependente da minha poltrona.
Ela é desconfortável pra todo mundo que senta nela. Ela é até feia e está longe de estar dentro dos padrões modernos e exigíveis pela moderna arte decorativa de ambientes.
Mas sou dependente da minha poltrona. Nem o melhor dos filmes da TV será bom se não for na minha poltrona.
Sou dependente do meu telefone celular. E meu celular nem é daqueles que todos desejam. Mas se não for no meu celular, acho que nem telefonar eu sei.
Sou dependente da minha internet. Não da conexão. Estou falando da minha conexão. Aquele que só eu tenho a senha e que na verdade deixei liberada pra todo mundo do prédio usufruir.
Um dia sem a minha internet pode significar graves crises existenciais e talvez até produza dores de abstinência.
Sou dependente da minha casa. Quando passo tempo demais longe de minha casa acho que entro na mais terrível das melancolias. Nem o mais caro palacete de Mônaco chega aos pés da minha casa. Nenhuma suíte do Aldorf Astoria me aconchega como minha casa. A mais bela mansão na mais bela praia da Grécia onde ninfas se banham nuas nos quintais não seria nada se comparada a minha casa.
Sou dependente das minhas pessoas.
Não de todas as pessoas, porque nem conheço todas as pessoas. Mas das minhas pessoas.
Dependo do amor e do carinho que recebo de minhas pessoas. Até posso gostar do amor e do carinho que eventualmente  possa receber de outras pessoas. Mas só sou feliz com tudo aquilo que minhas pessoas me dão.
Mas ....
Um dia o carro foi corroído pela ferrugem, porque metais tendem a ser consumidos pela ferrugem.
No outro dia a poltrona quebrou e não teve prego nem parafuso que a mantivesse de pé. E seu único destino possível foi o fogo.
No mesmo dia o telefone celular do nada deu pau! Não funcionou mais. Quebrou, fundiu, deletou, apagou. Porque é isso que acontece com telefones celulares.
E penso que o mesmo "bug" afetou a internet porque ela também apagou, deletou, sumiu. Porque é isso que acontece com a internet.
E veio um vendaval é em poucos minutos não tinha mais casa.
E as pessoas se foram junto com o vendaval e com a casa. Porque pessoas não são consumidas pela ferrugem e nem se transformam em cinzas depois de quebradas e sem concerto.
Minto.
As minhas pessoas ficaram!
E a vida segue.
Porque na verdade, eu sou dependente apenas das minhas pessoas!
Essa crônica não se refere à mim! Se refere à mim, à tu que estás lendo, aos bilhões que nunca vão ler, aos bilhões que já morreram e aos bilhões que ainda vão nascer.
Fraterno Abraço!
André Lacerda - Psicanalista

   
   

  

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Mais Uma dos Amores Virtuais!

Vou retomar um assunto recorrente: Os amores "virtuais"!
E faço isso por absoluta contingência informativa, uma vez que casos como os que citarei hoje tem sido muito frequentes não somente na minha atividade clínica, como na de muitos colegas psicanalistas, psiquiatras e psicólogos. 
O Caso:
Paciente adulto, formação acadêmica superior, sentindo-se à beira do abismo do suicídio (metafórico ou não), em virtude daquilo que o psicanalista num primeiro momento pensou na Hipótese Diagnóstica de Transtorno Depressivo Recorrente. 
Razão do desencadeamento do sintoma: Descobriu que seu amor de quase um ano, era na verdade um personagem inexistente da internet. 
Clássico: Inibição = sintoma = angústia. 
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Vou começar abordando algumas questões da anamnese:
- Como pode Doutor? Eu tenho formação superior, tenho mundo, tenho experiência de vida, sou inteligente... Como posso ter caído nesse conto tão primário?
- Como pude ter sido alvo de uma psicopata que se divertiu comigo durante quase um ano?
- Como pode existir uma pessoa que tenha coragem de fazer isso com outras pessoas sem a menor compaixão e misericórdia?
- O que faço com essa coisa que foi criada dentro de mim e que até agora me fazia um ser melhor e mais feliz?
- E agora Doutor??? Eu não vou aguentar!!!!!
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Ainda não sei como vou ajudar meu paciente na construção ou na destruição dessa estrutura. Só sei e ele sabe que estaremos de mãos dadas atravessando o inferno ou o paraíso. Não sei. 
Mas penso que é muito cedo e prematuro tentar identificar que por trás da tela do computador exista ou existam seres psicopatas e de tal maneira perversos que vivem seus dias em busca de vítimas. Deve existir sim. Mas cada caso é um caso. 
Penso que os idealizadores de falsos perfis e os ditos "fakes" de um modo geral, são pessoas solitárias que criam imagos baseadas nas suas próprias ausências. 
A tecnologia proporcionou ao humano, ser o que ele bem entender nesse dito mundo virtual. Criam-se alter egos suplementadores de carências com a facilidade que se toma um copo de água.
Mas isso é  não é fruto de um programa de computador. Isso é fruto da psique humana . E tudo que é semeado nessas relações também é humano. Não é virtual. 
Criam-se afetos, amores,paixões, ódios, prazeres, amizades... tudo que é humano. 
E surgem os sofrimentos. Mas os sofrimentos também surgem quando o encontro se inicia num barzinho ou numa reunião da faculdade. 
Se eu tivesse que fazer um alerta, faria dois:
1) Confie no seu desejo!
2) Confie no seu inconsciente!
Terminei a primeira consulta com meu paciente lhe orientando a aproveitar o que de bom surgiu dentro dele nesses últimos meses...
Fraterno abraço!
André Lacerda - Psicanalista

  

sábado, 12 de setembro de 2015

Só um Pôr de Sol!

Ele estava na beira do cais do porto. 
Um barco vinha e outro ia. 
Três mulheres negras vestidas de branco ofertavam flores amarelas pra deusa das águas.
O vento frio daquele fim de inverno cortava o calor do Sol e revoltava as ondas que batiam no pier.
Um desvalido da sorte (??) aconchega-se na grama e dorme sem a menor cerimônia e sem a menor culpa.
Os biguás pescadores se refocilam na água e se fartam de peixes de um cardume passageiro.
Os namorados passeiam de mãos dadas e buscam algum canto afastado ou para o exercício do amor ou para o exercício de inalar uma fumaça suspeita. Não deu pra saber e nem ver. 
A moça tira uma foto de si mesma pensando em ostentar o início do pôr do Sol, mas na verdade o destaque é para uma placa velha e suja que avisava: Cuidado! Águas profundas e poluídas.
Dois turistas se abraçavam e bebiam talvez a primeira das muitas cervejas. Ou a última. Não deu pra saber e nem ver. 
Aquela hora do dia era uma hora triste para o psicanalista. O entardecer era o ocaso do dia.
Mas pensou que amanhã outros barcos viriam e iriam.
E outras mulheres jogariam flores na água para a deusa, e os biguás se fartariam de um outro cardume passageiro.
As águas continuariam profundas e poluídas e as pessoas ainda retratariam o pôr do Sol.
Estava encerrado o dia enfim!
Ao ver o sol se pondo pensou no comentário que Freud fez referindo-se ao exílio em Londres:
"O sentimento de triunfo ao me ver libertado acha-se tão fortemente vinculado à dor, já que sempre amei profundamente a prisão da qual fui libertado."

Fraterno Abraço!
André Lacerda - Psicanalista
P.S.: Esse é o Pôr do Sol em Porto Alegre.



quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Em Busca do Tempo Perdido!

O título nos remete de imediato a obra de Marcel Proust, onde transformou o tempo em principal personagem de seu romance. 
Sei que a obra nem de longe é considerada popular e acessível. Muito pelo contrário. E não sei se eu teria capacidade de escrever sobre ela de uma maneira que agradasse à quem quer que seja. Ainda mais eu, que quando não tenho o que fazer, brinco de ser escritor segundo alguns. No entanto, quem tem padrinho não morre pagão. E com a devida licença, nesta minha crônica de hoje, vou me valer do meu amigo David Coimbra e sua obra  Um História do Mundo (2012- Ed LPM).
Proust foi considerado pela crítica literária um dos quatro escritores essenciais do século XX. Os quatro eram ele, James Joyce, Kafka e Freud. 
O David diz que ele era um homem estranho. Um autêntico filhinho da mamãe. 
A obra monumental desse menino mimado é um romance sobre a tragédia do tempo. O tempo que transforma as pessoas em outras pessoas, que passa e não volta mais, o tempo que pode ser aprisionado e que só pode ser recuperado através da arte  de eventuais investidas da memória. 
Do primeiro livro de Em Busca do Tempo perdido, repasso alguns pedaços, com a tradução feita por ninguém menos que... Mário Quintana.

"Acho muito razoável a crença céltica de que as almas daqueles a quem perdemos se acham cativas nalgum ser inferior, num animal, um vegetal, uma coisa inanimada, efetivamente perdidas para nós até o dia, que para muitos nunca chega, em que nos sucede passar por perto da árvore, entrar na posse do objeto que lhe serve de prisão. Então elas palpitam, nos chamam, e, logo que as reconhecemos, está quebrado o encanto. Libertadas por nós, venceram a morte e voltam a viver conosco.
É assim com o nosso passado. Trabalho perdido procurar evocá-lo, todos os esforços da nossa inteligência permanecem inúteis. Ele está oculto, fora de seu domínio e do seu alcance, nalgum objeto material (na sensação que nos daria esse objeto material) que nós nem suspeitamos. 
Esse objeto, só do acaso depende que o encontremos antes de morrer, ou que não o encontremos nunca."
Segue Proust:
"Ela mandou buscar um desses bolinhos pequenos e cheios chamados madeleines e que parecem moldados na valva estriada de uma concha de São Tiago........estremeci, atento ao que se passava de extraordinário em mim. Invadira-me um prazer delicioso, isolado, sem noção da sua causa. Esse prazer logo me tornara indiferentes as vicissitudes da vida, inofensivos os seus desastres, ilusória a sua brevidade, tal como o faz o amor, enchendo-me de uma preciosa essência; ou antes, essa essência não estava em mim; era eu mesmo. Cessava de me sentir medíocre, contingente, mortal. De onde teria vindo aquela poderosa alegria? Senti que estava ligada ao gosto do chá  e do bolo, mas que o ultrapassava infinitamente r não devia ser da mesma natureza." 
Explica e grande David Coimbra:
" Ao sentir o sabor de uma madeleine amolecida pelo chá quente, Proust sentiu o sabor do passado. Um objeto inanimado, um pequeno biscoito, foi o suficiente para desencadear todo um processo de recuperação do tempo perdido. Como se Proust fosse um arqueólogo, porque é precisamente isso que o arqueólogo faz: busca nos objetos o tempo perdido."

Espero que tenham gostado. Mas recomendo tanto a obra do Proust como a do David citados aqui.
Fraterno Abraço
André Lacerda - Psicanalista