sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Retorno à Freud - A Invasão Nazista e a Fuga da Áustria.

Bem no início do ano de 1933, Adolf Hitler assume o poder na Alemanha, dando início a um longo período de terror para os judeus, que começam a ser perseguidos. Muitos psicanalistas, prevendo épocas conturbadas, já haviam emigrado no ano anterior para os Estados Unidos, e, agora, os que ficaram eram obrigados a fugir pelo iminente fechamento do Instituto e da Sociedade de Psicanálise de Berlim. Também os filhos de Freud que, com suas famílias, viviam nessa cidade tiveram de abandoná-la. Embora várias pessoas aconselhassem Freud a emigrar para a Inglaterra ou para os Estados Unidos, por estar a Áustria ameaçada pela proximidade de um país dominado pelo nazismo, ele se recusava a expatriar-se, esperançoso de que sua terra fosse preservada da avassaladora destruição, como dizia, de Logos (do saber) e de Eros (do amor) efetuada por Hitler. Até a queima de seus livros em praça pública em Berlim pelos nazistas, em 1933, deixara-o ainda capaz de ironicamente comentar:
 "É um progresso o que está se passando. Na Idade Média, eles teriam jogado a mim na fogueira; hoje em dia contentam-se em queimar meus livros."
Em 1936, provando, pelo contrário, que os nazistas não se contentavam com isso, a Gestapo apoderava-se de todos os haveres do movimento psicanalítico alemão (inclusive da Verlag editora). E, em 11 de março de 1938, os alemães invadiram a Áustria trazendo a onda negra de perseguições judaicas. Nesse mesmo dia vários amigos acorreram à casa de Freud, insistindo novamente para que deixasse o país; conseguiram finalmente convence-lo, só que um pouco tarde, pois agora os judeus, para sair, deviam obter uma prévia "permissão legal".
A casa de Freud foi invadida várias vezes por gangues perambulantes das S.A. ( milícias nazistas), "jovens de olhares canalhas, armados de punhais e pistolas", conforme descrição de Schur (médico pessoal de Freud), que pilharam o dinheiro, ocorrendo o mesmo na sede da Verlag em Viena, onde se encontrava Martin Freud (filho). Mais sérias eram as buscas efetuadas pelos agentes da Gestapo entre as cartas e fotografias, procurando as assinadas por Einsten, considerado inimigo da pátria alemã. Um dia levaram Anna (filha), deixando aflitíssimo o pai, que ficou andando para cima e para baixo o dia inteiro de sua ausência, sem parar de fumar, pelo terror de que ela não mais voltasse, como ocorria frequentemente aos judeus quando arrastados de suas casas. Mesmo querendo agora sair do país, Freud  não tinha condições de pagar a "taxa" pedida pelos nazistas, de vinte por cento dos bens para cada judeu que quisesse emigrar, pois sua família era relativamente grande, ao passo que os cofres de casa e da editora já tinham sido esvaziados. Quem os ajudou nesses momentos foi Marie Bonaparte, que pagou as taxas devidas, embora Freud aceitasse o auxílio com a condição de reembolsá-la.
Com relação às complicadas formalidades, sabemos por intermédio de Ernest Jones (amigo e biógrafo de Freud) que Freud teceu um novo comentário irônico quando foi obrigado a assinar, para o visto de saída, um documento no qual devia atestar ter sido "bem tratado pela Gestapo...podendo viver e trabalhar em plena liberdade... não tendo qualquer razão de queixa". Freud perguntou se lhe era permitido acrescentar uma sentença do tipo: "Posso de coração recomendar a Gestapo a qualquer pessoa???".
No dia 4 de junho de 1938, Freud deixava definitivamente Viena, acompanhado por sua mulher, pela filha e por duas fiéis empregadas. Seu médico particular, Schur, viajaria em seguida.
Ao passar por Paris ( onde permaneceu na casa de Marie Bonaparte por um dia "que nos devolveu a dignidade e a têmpera) e em sua chegada à Inglaterra foi acolhido com estrondosas honrarias. Freud gostava desse seu país adotivo que sempre estimara e onde Jones, vários discípulos e futuros pacientes o tinham esperado ansiosamente. Ele podia passar agora horas deliciosas no belo jardim em frente ao seu escritório. Apesar das regalias, comentou um dia:
"O sentimento de triunfo ao me ver libertado acha-se tão fortemente vinculado à dor, já que amei profundamente a prisão da qual fui libertado."

Na próxima publicação da série, abordarei a morte de Freud.
Na ilustração abaixo, o consultório de Freud em Londres, até hoje preservado e visitado diariamente por milhares de pessoas.
Fraterno abraço
André
  

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