É interessante observar como algumas obras de Freud no período de maturidade encontram inspiração no que ocorrera com seus discípulos. Em 1913, na época da ruptura com Jung, um e dois anos, respectivamente, após a ida de Stekel e Adler, Freud publica Totem e Tabu, no qual dala do assassinato do pai da horda primitiva pelos filhos que se sentem subjugados por ele. Na história da humanidade, disso discorreriam restrições sobre os impulsos (culpa), originando as práticas religiosas (pelo receio de que outro crime se repetisse agora com eles) e o estabelecimento das normas sociais, com suas leis.
Também em 1913 conclui o ensaio Moisés de Michelangelo. Examinando os pormenores dessa estátua, observa representar Moisés vencendo o impulso de despedaçar a Tábua dos mandamentos no momento em que percebe que seu povo, ao construir o bezerro de ouro e dançar ao redor dele, regredira a uma crença anterior. Embora Freud não se refira especificamente a isto, neste ensaio, é possível, pela época, supor-se sua ira contida, identificando-se com Moisés, quando comenta, ao interpretar a postura da estátua:
" a luta bem sucedida contra a paixão anterior, em benefício de uma causa a que ele se dedicou", quando há " o conflito que deve surgir entre tal gênio reformulador e os resto da humanidade".
Freud considerava que, deixando de lado a teoria da sexualidade, seus discípulos dissidentes tinham buscado algo mais facilmente aceitável pela cultura, embora com isso fizessem regredir as conquistas alcançadas pela Psicanálise. Quase confirmando essa ideia, Jung escrevera-lhe da América: "Acho que minha versão da Psicanálise conquistou muitas pessoas que tinham até então permanecido afastadas em virtude do problema da sexualidade na neurose".
Em 1918 Freud publica História de uma neurose infantil ( o homem dos lobos), onde contesta as afirmações de Adler e de Jung, ao trazer um caso no qual se evidencia ter havido uma angústia sexual traumática infantil precedendo o desencadeamento posterior da neurose, na idade adulta.
Freud, preocupado pelo destino que teria a sua teoria e técnica nas ma~so de seus discípulos, começou a sentir certa saudade dos anos anteriores de "esplêndido isolamento", nos quais, como um Robinson Crusoé, embora sozinho, podia explorar sem intromissões sua ilha desconhecida, isto é, a Psicanálise. Comenta então em 1914:
"Quando penso nesses anos de solidão e os comparo com os anos de desordem e de tormentos nos quais vivemos atualmente, eles me parecem ter sido uma época bela e heroica".
As dissidências de Adler e Jung foram as que mais tocaram Freud. Outros discípulos, ao se afastarem dele, deixaram-no muito menos atingido. Em parte por lhe serem menos importantes; em parte por ele ter, com o passar do tempo, um número sempre crescente de pessoas que o procuravam, assegurando-lhe, indiretamente, não haver risco de desmoronar o edifício psicanalítico por causa de alguém que se fosse.
Fraterno Abraço
André
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